b) Perigos na leitura

2. Perigos que espreitam os grupos bíblicos Nem tudo são rosas nos grupos. Há espinhos e também muitos perigos. O nosso contacto com muitos grupos bíblicos leva-nos a esclarecer alguns pontos que achamos de grande importância para a leitura da Bíblia em privado e em grupo. Enumeremos apenas os mais graves:

A monotonia: ao fim de algum tempo, o grupo pode começar a repetir-se: já se sabe o que este ou aquele vai dizer, falta a imaginação para variar a celebração e / ou a metodologia da reunião. Tal monotonia leva, muitas vezes, ao abandono por parte de muitas pessoas. Não raras vezes, pelo mesmo motivo, todo o grupo desaparece. Para obviar a esta dificuldade do grupo, é necessário muita imaginação, estudo e participação em cursos, sobretudo por parte dos animadores.

O isolamento em relação à grande comunidade, à paróquia: este é um perigo comum a qualquer grupo e que deve merecer, por parte dos responsáveis, o acompanhamento mínimo de todos os grupos paroquiais, e não apenas de alguns. O texto de Paulo, em 1 Cor 12-14 – sobre os carismas próprios de cada um e de cada grupo – pretende responder a este perigo, que já era real nas primeiras comunidades cristãs. Os grupos não podem colocar-se ao lado ou acima da comunidade, como acontece por vezes, mas ter a consciência de que são simplesmente parte integrante da Igreja, para a beleza da qual devem contribuir com os seus carismas.

A tentação do fundamentalismo: a tentação do fundamentalismo pode bater à porta de qualquer pessoa que lê a Palavra de Deus em grupo ou privadamente. Sabemos que as seitas modernas – sempre houve seitas, ao longo dos 20 séculos de história da Igreja – são todas de cariz fundamentalista, isto é, interpretam a Bíblia à letra, vêem apenas aquilo para o qual determinado interesse lhes desperta o apetite. O fundamentalismo é, essencialmente, uma perspectiva parcial da Bíblia. É aí que reside o seu erro. A falta de estudo, a dificuldade que as pessoas têm de ler, hoje, é uma das principais causas do fundamentalismo. Mas se, pela lei da maçã podre, um elemento fundamentalista pode tornar fundamentalista todo o grupo, por outro lado, também é verdade que é precisamente no grupo que esta tentação pode ser vencida com maior eficácia. Sobretudo pela formação – cada vez mais urgente – de animadores e agentes de pastoral que trabalham na paróquia.

Fazer da Bíblia um livro de receitas de moral: Considerar a Bíblia como um livro de receitas para a conduta humana não é totalmente errado. Mas estamos em presença duma visão parcial da Bíblia, que se deve evitar a todo o custo, tanto na leitura privada como em grupo. A Bíblia não é uma farmácia de remédios para as nossas doenças e de vitaminas para as nossas fraquezas. É muito mais do que isso. Além do mais, os 2500 anos que nos separam da escrita destes textos nem sempre facilitam boas “receitas de moral” para a Igreja e para cada pessoa em particular. A Bíblia, mais que um manual de boa conduta, é uma Boa Nova de Deus para os homens. Mais que as “receitas”, interessa fixar os princípios, as grandes ideias teológicas. Por outro lado, não podemos ver a Bíblia como algo morto e material, pertencente a um passado histórico mais ou menos longínquo. Segundo essa hipótese, a Bíblia não passaria duma colecção de bons pensamentos… A Bíblia não se pode definir como um livro, uma coisa, um “algo”. A Bíblia é sobretudo um ALGUÉM que fala comigo.

Ler um texto sem ter em conta o contexto: É costume dizer-se que a Bíblia não é um livro mas “uma biblioteca”. Mas podemos dizer que se, materialmente, a Bíblia é uma biblioteca de várias dezenas de livros, espiritualmente falando, a Bíblia é um só livro em muitos capítulos. Pois, é bem verdade que a Boa Nova da Bíblia, mais que num texto concreto, se encontra no seu conjunto. É uma revelação progressiva da vontade de Deus, em livros e géneros literários muito diferentes, que não se encontra plenamente, num único texto. As seitas fundamentalistas fazem a leitura da Bíblia precisamente ao contrário do que acabamos de dizer: prescindem não somente do contexto geral da Bíblia e do contexto histórico de cada livro, mas também do contexto mais próximo de determinado texto. Coisas semelhantes podem acontecer em grupos católicos: muitas vezes, saem do texto e fazem-no dizer o que ele nunca disse: Passagens, por vezes, muito simples levam os leitores a andar errantes por outros caminhos. Por isso, se aconselha a olhar para o texto, no seu vocabulário e na sua estrutura interna, assim como para o seu contexto próximo e remoto. Só se pode sair do texto depois de se ter lá entrado. O que muitos leitores nunca chegam a fazer.

Pretender dominar, magicamente a Palavra de Deus: A Bíblia é Palavra de Deus, mas não é sempre evidente o modo como Ele me fala e quando me fala. Por isso, dizer, por exemplo: “O Senhor diz-me isto, nesta Palavra”, pode ser um modo de tentar a Deus. A Palavra de Deus é uma palavra certa, mas escapa-se-nos. Não a podemos dominar, magicamente. Porque Deus é, ao mesmo tempo, o nosso Amigo e o totalmente Outro, o que transcendente tudo e todos. A Sua Palavra é sempre misteriosa e não se revela automaticamente na leitura da Bíblia. Nunca a descobrimos totalmente. As nossas fórmulas referentes à Palavra de Deus devem ser mais prudentes: “Parece-me que o Senhor me chama a fazer isto, porque…”. Deus não se encontra à nossa mão de semear.

Ler a Bíblia como história e não como livro de fé: à primeira vista, a Bíblia aparece-nos como um livro de história antiga, dum povo antigo. O fundamentalismo caiu nesta ratoeira, agarrando-se muitas vezes a pormenores de história e de cultura antiga, de somenos importância, e perdendo a riqueza teológica global e a beleza dos grandes horizontes da Bíblia. Os escritores da Bíblia não pretenderam desempenhar o papel de historiadores propriamente ditos, mas de catequistas. Muitas vezes, fazem catequese em forma de história para melhor “contar” a mensagem e, deste modo, a fixar melhor nos leitores e ouvintes. A nossa atitude fundamental, hoje, ao ler a Bíblia, é a de crentes e não a de estudantes de História. E quando lemos os textos históricos da Bíblia temos que procurar encontrar neles, antes de mais, o Senhor da História daquele povo e da nossa própria História, individual ou colectiva.

Autoria: Frei Herculano Alves, OFMCap – Lisboa – Portugal
(fonte: http://www.capuchinhos.org – cópia com a devida autorização)
Retirado apenas parte do texto e com pequenas adaptações para uma leitura mais leve e compreensão no Brasil.

comentário(s)

  1. Nadia disse:

    Gostei do artigo, bom para reflexão. Faço estudo da Bíblia e aqui encontrei uma fonte para meu crescimento.

  2. Maria da Conceição Silveira disse:

    Gostei muito dos textos, muito bom para
    a informação e a formação espiritual.

  3. claudia nicole disse:

    Esse artigo nos chama a atenção para não nos tornarmos como os fariseus, doutores nas leis, duros de coração e tardos para a misericórdia.

  4. lucinete disse:

    Gostei! Vou frequentar. Abraços!

  5. lucinete disse:

    Quero saber qual o significado do TAU. Obrigada.

  6. antenor disse:

    estamos preparando equipe de formação vocacional, poderiam nos formecer subsidios para nós termos este serviço em minha paróquia?

  7. Antonio Silvio Rodrigues Ferreira disse:

    Perigos na leitura.
    Realmente ao abrir a Bíblia ao acaso não acontece somente com as seitas, na Igreja Cátolica também. Nos grupos Carismáticos é comum esta prática, alguém abre a Bíblia, após a leitura da mesma, alguém também abre a sua e diz: confirmando aquela passagem, é como se Deus falasse somente a eles e não aos demais, isso gera uma desconfiança a quem foi lá para amar e adorar o Senhor, perguntando: porque Deus não fala também comigo? E muitos vão embora e não voltam mais. Será que Deus,nos grupos de orações falam a uns e a outros não? Tenho certeza que não, pois Deus, não faz acepções de pessoas. Paz e bem.

  8. Everaldo Costa Silva disse:

    Olha,

    Hà mais ou menos 7 dias, tem acontecido diversos fatos comigo que não é de meu conhecimento e nem do mesmo nível de mentalidade que o meu !

    Me parece (com uma certa certeza), que Deus tem conversado comigo, me livrado de algumas coisas, me mostrado e ensinado muita coisa que eu jamais aprendi até mesmo lendo a biblia !

    Quero orientação !

    Se possível, responda pelo e- mail que eu tenho detralhes pra contar !

    Tenham uma boa noite !

    Everaldo – 23/04/2010

  9. lucia disse:

    parabens pelo artigo é maravilhoso

  10. lucia disse:

    todos os artigos são muito bons,trabalho com a liturgia em minha comunidade e gostaria de saber se voces tem algum material de dinamicas
    para a liturgia ou seja as missa .

  11. bernardete disse:

    Um artigo de grande importancia para os católicos, praticamos coisas erradas muitas vezes por ignorancia,são artigos assim que enriquecem nossos conhecimentos . Pena que nem todos tem acesso a estes artigos. Pa
    rabéns ,apredi muito . Apaz de Crito.
    Bernardete Rizzi 01 de abril de 2011

  12. Carlos disse:

    Muito esclareçedor e fico muito feliz de poder contar com a valiosa contribuição dos fransciscanos… amo vocês! Obrigado Senhor Jesus!

  13. joao angelo nunes leal disse:

    Excelente texto.

    Concordo plenamente com a colocação da senhora Claúdia Nicole.
    Precisamos ler a Bíblia à Luz do Espírito Santo.
    Eu Vos dou graças ó Senhor por me estais dando a conhecer todas estas coisas.

Deixe uma resposta